Mulheres não foram ensinadas a amar o próprio corpo. Pelo contrário, toda e qualquer crítica sempre soou com certa normalidade, como se o corpo feminino fosse de domínio público e estivesse aberto para opiniões diversas.

Desde muito cedo o corpo da mulher já é apresentado ao mundo como defeituoso, apesar de ser perfeito, nutrido e saudável. Uma das frases mais impactantes da minha infância foi no ballet: “para ficar bonita, tem que sofrer”. Ouvi de quem arrumava meu penteado, num daqueles rabos de cavalo bem esticado, enquanto eu segurava o choro e o elástico de cabelo. Um pouco mais tarde ouvi que meus “delicados pés, ficariam muito feios por causa do ballet”. Ouvi comentários também quando decidi treinar triatlo: “vai ficar musculosa demais”. Já nos meus anos de Muay Thai vicei em usar tranças no cabelo e passaram a me dizer “você sabe que homens gostam de cabelo solto, né?”.

Toda mulher já foi vítima de críticas sobre o próprio corpo oriundas dos padrões estéticos unânimes da sociedade. No esporte não é diferente. Um corpo forte demais, musculoso demais, braço definido demais, barriga trincada demais, a cada fala é como se, novamente, quisessem tirar o nosso direito de simplesmente pertencer ao corpo ou esporte que queremos. Como se o nosso corpo tivesse como objetivo ser visualmente agradável aos outros. Como se não valesse em nada nossa potência e resistência.

Nas entranhas do sistema sabemos que o objetivo da pressão estética é delimitar os lugares que mulheres podem estar. O esporte, por exemplo, não foi feito ou pensado para mulheres. Fincamos uma bandeira e diariamente avançamos na conquista por voz e espaço. Esse movimento não só aumenta o número de meninas e mulheres no esporte, como traz consciência sobre potência e resistência do corpo feminino.

É através dessa consciência que o empoderamento desabrocha e tomamos o olhar de uma nova perspectiva: o esporte vai além de todas as narrativas rasas que nós, mulheres, ouvimos no decorrer da vida – de dietas a padrão de beleza.

Quantas meninas deixam sua potência no esporte de lado por padrões estéticos? Uma garota de 10 anos de idade não deveria ficar em dúvida se continua ou não as aulas natação porque as costas mais largas podem ficar mais largas. A dúvida deveria ser em torno de curtir ou não praticar o esporte.

imagem: reprodução / arquivo pessoal: Nana Almeida

O que deveria importar para uma menina de 10 anos de idade ou para uma mulher de 35 que tem a natação como esporte é o quanto elas estão se divertindo e criando conexão com o corpo.

Antes de trabalhar diretamente com esporte nunca havia parado para estudar o quanto a pressão estética afasta meninas e mulheres da pratica esportiva. A tensão é uma ruptura e tanto para mulheres no esporte – inclusive no alto rendimento, já que limita não só na quantidade, mas também talentos que são impedidos de crescer.

Muito além do corpo, deveríamos trazer para pauta a potência, resistência, resiliência e outras tantas emoções e habilidades que são lapidadas na prática esportiva. Valorizar o corpo da mulher além da estética ensina a futuras gerações que elas podem ser o que quiserem e, de verdade, não há nada mais empoderador do que isso.

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