Minha conexão com a Vanessa Freitas começou no Cotidiano Dela, meu primeiro projeto sobre protagonismo feminino. Ela era leitora, e sempre interagia com as publicações. A aproximação aconteceu por amigas em comum, e conhecer a “Ne” pessoalmente, mesmo que em breves encontros, desabrochou papos profundos sobre vida, inspiração, propósito e sensações muito semelhantes.

Dos tantos pontos em comum, o esporte foi um deles. Antes da explosão da Pandemia no Brasil, entrevistei a Vanessa para falarmos sobre esporte – corrida, mais especificamente. No relato `a seguir, conto um pouco mais sobre a história da Vanessa, e como colocar o tênis, e, botar para correr, pode salvar a vida física e mental de uma mulher.

imagem: arquivo pessoal/Vanessa Freitas

Movimentar o corpo para a “Ne” sempre foi sagrado, tanto que, a atividade física e o esporte sempre fizeram parte da sua vida. O vôlei foi o esporte queridinho por bastante tempo, não que tenha deixado de ser, mas foi na corrida que encontrou a superação – mas já, já falamos mais sobre isso.

Mesmo praticando esportes desde muito nova e tendo hábitos saudáveis, não impediu que alguns problemas de saúde aparecessem. Entre os primeiros diagnósticos, o hipotiroidismo. Com o diagnóstico veio também o ganho de peso, 12 kg a mais que impactaram bruscamente na sua performance tanto atividade física, como no esporte. Lesões e machucados constantes acabaram afastando-a desse universo.

O hipotiroidismo foi o start para investigações mais profundas. Foram incontáveis diagnósticos errados, e uma a saúde física cada vez mais debilitada. Em 2017, depois de uma médica perseverar por uma resposta, veio a certeza: Artrite reumatóide. Um tipo, entre tantos, de reumatismo, autoimune, que não tem cura, e além disso é degenerativa, já que em estágio mais avançado pode até paralisar as articulações.

Receber e aceitar o diagnóstico foi um longo e dolorido caminho. Vergonha, vitimismo, aceitação e culpa. Surgiu até aversão a “auto promoção”, já que encontrou na rede social a oportunidade de compartilhar mais informações e vivências da doença. “Mas será que isso seria bom?”, “O que iriam pensar?”.

Como o Budismo mesmo diz: depois da ruminação, iluminação. “Tá tudo bem, existem soluções. Existe vida na Artrite Reumatóide. Por que não compartilhar o lado positivo?”. Bingo! Foi a partir dessa virada de chave que a Ne trouxe para o seu facebook e instagram relatos, dicas e inspirações para quem tem que conviver diariamente com a doença. Mas não só isso, Ne construiu um lugar de troca na internet e passou a inspirar ainda mais pessoas.

Junto com o diagnóstico vieram as recomendações. A base do tratamento para conviver com a Artrite Reumatóide, além de medicação e outras terapias, é atividade física. Como a doença pode paralisar articulações, manter o movimento é fundamental.

Como nada é por acaso…

A irmã, que já era adepta da corrida, tinha marcado uma prova para dezembro daquele ano, como não havia nenhuma contra indicação, Ne decidiu correr a prova. Sem treino, sem expectativas, sem limites. Um abraço no “Vamô ai” e uma única certeza: terminar o trajeto mesmo que andando.

Ne correu com a irm´ã lado a lado, foram 8km de uma parceria da vida toda. Correr e andar, correr e andar, correr e andar. Chegou ao fim da corrida exausta e feliz, “por que não continuar?”

Ne, junto a irmã, Faby. Imagem: Arquivo pessoal/Vanessa Freitas

Era o começo de uma nova história. Novos objetivos, novas amizades, novas decisões. Correr para melhorar não só o físico, mas o mental. O que ela queria era correr com qualidade e técnica. Mergulhar no mundo da corrida foi também um despertar para o autoconhecimento.

Não é sobre comprar a próxima corrida, mas como se preparar para ela. Ser diagnosticada com uma doença autoimune é ter atenção redobrada, inclusive quando se fica doente (gripe, resfriados, entre outras). O uso da medicação imunossupressora é constante, já que “desliga” o sistema imunológico e dá ao portador da doença autoimune certa qualidade de vida. Acontece que um pouco antes da primeira corrida “pra valer”, Ne ficou doente e deixou de tomar o remédio imunossupressor por 45 dias. Nem assim desistiu da prova – mesmo com a família achando melhor remarcar o desafio.

A linha de chegada daquela prova foi especial. Foi sentir o poder de conquistar tudo, de vencer qualquer coisa. Foram três ou quatro quilômetros acompanhados de perto pela irmã e um chamado para correr sozinha. “Eu precisava fazer aquela corrida sozinha. A corrida inteira, eu e minha consciência e ninguém mais”.

“Olhei para o céu, o que eu sentia era gratidão por estar ali. Eu só conseguia pensar: “eu vou conseguir”, “eu vou conseguir” . “Não vou negar, Ju, cheguei a pensar que ia morrer! Foi num posto de hidratação que eu tive uma certeza: chegar até o fim.”

O que ela não sabia é que aquele fim, era na verdade o começo. Nunca mais parou de correr, na rua ou na esteira.

“Correr é pertencer, superar. Correndo, me sinto a maior heroína do mundo. Cada movimento é uma grande conquista, pessoas querem grandes feitos, mas terminar uma corrida para mim, é um grande feito”.

E eu não poderia concorda mais, Ne.

imagem: arquivo pessoal/Vanessa Freitas
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